Planear uma Off-Season: Aspectos a Considerar

RESUMO:

O período de Off-Season tem sido cada vez mais visto como um momento de oportunidade no mundo do Futebol.

Este pequeno artigo aborda a importância de treinar durante este período de transição do campeonato que coincide com as férias dos(as) jogadores(as), e quais os fatores que devem ser considerados na elaboração de um programa de treino para cada atleta.

PALAVRAS-CHAVE:

Off-Season, atletas, férias, oportunidade, treino, capacidades, destreino, performance, risco


O QUE É UMA OFF-SEASON?

A época desportiva no futebol quer amador quer profissional, divide-se geralmente em 3 fases: Pre-competitiva (Pre-season), Competitiva (In-season), e Transição (Off-Season).

Esta última, constitui a fase de transição de uma época desportiva após 10-11 meses de treinos e jogos, onde os(as) jogadores(as) possuem um tempo de férias dos respetivos clubes com uma duração média de 4 – 6 semanas, podendo ser de maior duração em escalões inferiores.


QUAL A IMPORTÂNCIA DA OFF-SEASON?

Embora a palavra “férias” nos faça pensar em repouso e cessação das atividades desportivas, é recomendado que os(as) jogadores(as) durante a Off-Season se mantenham fisicamente ativos de modo a atenuar os decréscimos na sua condição física.

Um dos aspetos que reforça ainda mais esta perspetiva, é o facto do período seguinte , a Pré-época, se constituir como um curto período de tempo de preparação (4 – 6 semanas) onde os(as) jogadores(as) estão expostos a elevadas cargas de treino, jogos amigáveis/preparação frequentes, e a aumentos maiores e mais rápidos destas mesmas cargas do que em qualquer outra fase da época.

Existem dados que nos parecem indicar que rápidos incrementos de carga durante a pre-época  estão associados a um aumento do risco de lesão neste período (Gabbett, et al. 2007). Contudo também sabemos que durante as 4-6 semanas que antecedem o início da competição é importante desenvolver cargas elevadas, exigindo assim um equilíbrio entre o que é necessário desenvolver e de que forma vamos conseguir progredir para alcançá-las.

Desta forma, os(as) jogadores(as) não têm de estar preparados para o período competitivo no fim da Off-Season, mas têm de estar preparados para o início da Pre-Época. Quem aparecer melhor preparado, conseguirá estar mais vezes disponível para treinar/jogar, com um risco de lesão mais baixo, muito mais perto de ser uma opção regular para o Treinador para ajudar a sua equipa.

Quanto maior a duração do período de Off-season maior a necessidade em treinar durante o mesmo.


ALTERAÇÕES FISIOLÓGICAS ASSOCIADAS À OFF-SEASON

  1. COMPOSIÇÃO CORPORAL

    Durante o período de férias, é normal que os(as) atletas modifiquem as suas rotinas alimentares, e que que isso provoque um ligeiro aumento da Percentagem de Massa Gorda quando associado a menos volume de treino semanal. Neste sentido é muito importante estarem ativos e expostos a um programa de treino que também procure diminuir as alterações negativas na %MG decorrente de alguns excessos cometidos nas férias e de menor volume de treinos.

    Outro aspeto importante, é o deste período permitir a atletas que necessitem de aumentar a sua Massa Muscular, fazer um trabalho de Hipertrofia com maior volume do que aquilo que conseguem fazer durante o período competitivo. Assim, é fundamental que não só o treino de força esteja estruturado face ao objetivo, como também a rotina de alimentação por parte de um Nutricionista.

  2. CAPACIDADE NEUROMUSCULAR

    Em termos de capacidades altamente influenciadas pelo nosso sistema neuromuscular como a capacidade de salto, 6-8 semanas onde apenas foi realizado treino aeróbio de baixa intensidade parece estar associado a uma redução moderada de alguns testes de performance relacionados com a capacidade de produzir força como o CMJ e o SJ.

    Este efeito diminuído na capacidade de produzir força explosiva pode estar atribuído a uma redução de utilização das fibras musculares tipo II numa situação de cessação de treino. 

    Nesta ordem de ideias também a velocidade ou capacidade de sprint, quando não incluída num programa de treino na Off-season,, parece acarretar um decréscimo na performance dos tempos aos 10m-Sprint e 20m-Sprint. (Koundourakis NE, et al. 2014), para além de uma diminuição acentuada na carga crónica desenvolvida em tarefas de alta intensidade onde estruturas como os tendões são fortemente solicitadas. 

    Então, no período de transição devemos incluir não só exercícios com o objetivo de desenvolver a Força Máxima no ginásio, mas também exercícios de salto e de velocidade que garantam maior especificidade das tarefas e elevada solicitação do sistema neuromuscular.

  3. CAPACIDADE AERÓBIA

    Sendo esta uma capacidade fundamental para o futebol e que sustenta uma grande parte das ações dos(as) jogadores(as) em campo, devemos ter em atenção os potenciais decréscimos no VO2máx associados a uma situação de destreino completo na Off-season.

    De acordo com Sotiropoulos, et al. (2009), jogadores que seguiram um plano de treino estruturado durante o período de transição tiveram menor declínio (-1,4%) do VO2máx face aos que não seguiram um plano (-6,1%) durante este período.

    Relativamente à dose necessária para atenuar os declínios de VO2máx, e sabendo que esta mesma dose é influenciada por diversos fatores e deve ser contextualizada, Slettalokken, et al. (2014) mostraram que apenas 1 sessão de Treino HIT de corrida (High Intensity Training ) constituída por 5x 4 min @ 87-97% FCmáx, parece atenuar os decréscimos  (PC=-2%) no VO2 máx.

    Muitas vezes a prescrição do treino de corrida durante a Off-season traduz-se em treino contínuo de baixa intensidade que promova o desenvolvimento de uma base do nosso sistema aeróbio. Embora este ponto seja bastante relevante, não nos podemos esquecer das características do esforço da modalidade, onde se intercalam períodos de esforços de elevada intensidade com períodos de baixa intensidade. A exposição ao treino HIT de corrida, onde o atleta trabalha com velocidades de corrida mais elevadas, deve também ser assegurada durante a Off-season de modo a prevenir um acentuado decréscimo da Economia de Corrida, aumento da fadiga e carga interna associadas a determinadas cargas de treino impostas na Pré-Época.


QUAIS OS PRINCIPAIS ASPECTOS A TER EM CONSIDERAÇÃO NA ELABORAÇÃO DE UM PROGRAMA DE TREINO PARA A OFF-SEASON?

  1. INDIVIDUALIZAÇÃO

    Uma das vantagens deste período onde os(as) jogadores(as) se encontram de férias, é a capacidade que temos de individualizar o programa de treino para as necessidades específicas de cada um, ao contrário daquilo que na maioria das vezes acontece durante a época devido ao elevado nº de atletas e tarefas que temos ao mesmo tempo (se trabalharmos em contexto de clube).

  2. JOGOS / MINUTOS REALIZADOS

    É de extrema importância olhar para a utilização de cada um dos(as) jogadores(as) no fim da época, e filtrar quem foi que teve mais minutos e menos minutos. Por si só esta abordagem pode constituir uma grande diferença naquilo que serão os objetivos e tipos de treino realizados.

    No caso de existirem dados relevantes da Carga Externa  (ex: dados GPS) realizada pelo(a) atleta ao longo da época, estes podem e devem ser considerados na individualização da prescrição, nomeadamente no Volume e Intensidade de Corrida.

  3. SITUAÇÃO ATUAL VS SITUAÇÃO FUTURO

    No seguimento do tópico anterior, durante este período de transição existem mudanças nos clubes durante a janela de transferências com a entrada e saída de jogadores, e por vezes o próximo projeto pode implicar a elaboração de um plano estruturado para exigências diferentes da próxima época.

    Atletas Escalão Juniores em transição para Escalão Seniores, atletas amadores que transitam para campeonatos profissionais, atletas que são vão jogar numa posição diferente da anterior, atletas que vão jogar para um campeonato de outro país, etc. São apenas alguns exemplos de questões que influenciam o planeamento.

     

  4. HISTÓRICO DE LESÃO

    Seja por lesões mais antigas ou mais recentes, devem ser consideradas no programa de treino de modo que se necessário o(a) jogador(a) trabalhe sobre algumas necessidades ou défices que poderão ter estado como fator de risco na lesão.

    Sabemos que uma lesão é multifatorial mas alguns desses fatores são modificáveis através do treino.

  5. OBJETIVOS E PREFERÊNCIAS DO JOGADOR

    Para garantir o compromisso e um elevado grau de satisfação pelo programa de treino não nos podemos esquecer de incluir, naquilo que é possível de individualizar, os objetivos já mencionados pelo(a) atleta e também as suas preferências relativamente aos tipos de treino, ferramentas utilizadas, forma de organização da semana, conjugação com as viagens nas férias etc.

    Atletas mais satisfeitos com o seu programa de Off-Season, vão cumpri-lo da forma mais correta, e isso trará menores decréscimos na sua condição física.

  6. PLANEAMENTO E VARIÁVEIS

    Existem várias maneiras de estruturar uma Off-Season, sendo que as melhores serão aquelas mais individualizadas aos atletas e que preparem de maneira mais específica para os requisitos da sua modalidade.

    Variáveis como Volume, Frequência, Intensidade, Tipo de Modalidade são peças chave na gestão de um bom programa de treino que permita que os(as) jogadores(as) realizem os treinos semanais com eficácia e com uma boa gestão da fadiga resultante entre treinos.

    Como referido anteriormente, o programa deve estar contextualizado para as férias dos(as) atletas no sentido de respeitar o tempo dedicado ao lazer e descanso, que na medida certa traz benefícios físicos e psicológicos depois de uma época longa e desgastante.

    No quadro abaixo deixo apenas alguns exemplos gerais de estruturar a semana de treinos para atletas que nas férias treinem 2 a 5x por semana.


BIBLIOGRAFIA

1.      Clemente, F.M., Ramirez-Campillo, R. & Sarmento, H. Detrimental Effects of the Off-Season in Soccer Players: A Systematic Review and Meta-analysis. Sports Med 51, 795–814 (2021). https://doi.org/10.1007/s40279-020-01407-4

2.      Silva JR, Brito J, Akenhead R, Nassis GP. The Transition Period in Soccer: A Window of Opportunity. Sports Med. 2016 Mar;46(3):305-13. doi: 10.1007/s40279-015-0419-3. PMID: 26530720.

João Gavazzo

- Licenciado em Ciências do Desporto 2015;

- Pós-Graduado em Strength & Conditioning 2016;

- Performance coach independente desde 2015;

- Fisiologista na U.D. Vilafranquense (2019 a 2021);

- Fisiologista no Petro de Luanda (2021/2022);

- Fisiologista na Alfra Clinic.

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